As negociações para o fim da guerra na Ucrânia finalmente deram um refresco ao dólar em escala global, impulsionadas pela inesperada disposição de Zelensky em buscar um acordo com Trump — sim, o mesmo Trump que até ontem o chamava de “ditador”. Como se não bastasse essa reviravolta, o secretário do Tesouro americano, Scott Bessent, já acena para a China, sugerindo que as hostilidades econômicas podem dar lugar a um acordo comercial. Esse cenário mais conciliador está injetando ânimo nos mercados europeus, que sobem nesta manhã embalados pela esperança de um desfecho diplomático com Moscou e de novos estímulos chineses.
Na Ásia, as bolsas também fecharam em alta, mesmo com o Japão flertando com novos aumentos de juros após dados de inflação e atividade mais fortes — aparentemente, nem o aperto monetário está conseguindo estragar a festa por lá. Enquanto isso, investidores seguem de olho em resultados corporativos e indicadores econômicos, sem perder de vista as eleições alemãs deste domingo, que prometem ser mais um capítulo desse roteiro geopolítico cada vez mais imprevisível.
Estamos nos arrastando para o fim de uma semana aparentemente mais calma. Mas não se engane: a ausência de volatilidade não significa que os problemas evaporaram. Eles estão apenas ganhando corpo nos bastidores, como uma tempestade em formação no horizonte — silenciosa, mas inevitável. Afinal, o mercado adora pregar peças justamente quando todos baixam a guarda.
· 00:59 — Puxou o saco
No Brasil, o Ibovespa avançou ontem (20), embalado pelo resultado acima do esperado da Vale (VALE3), enquanto o dólar recuou para R$ 5,70, refletindo a fraqueza global da moeda americana. Na agenda de hoje (21), a entrevista do ministro Haddad promete ser o centro das atenções, com a expectativa de detalhes sobre o orçamento de 2025 e as medidas para conter o crescimento dos gastos públicos — um tema convenientemente empurrado para escanteio diante das propostas mais expansionistas e eleitoreiras do governo, como a isenção de IR até R$ 5 mil, que também deve entrar na pauta.
Será interessante ver se Haddad comenta a fritura que sofreu enquanto estava fora do país. Ontem, Lula fez questão de derramar elogios ao ministro, numa clara tentativa de sinalizar apoio público — como se palavras gentis bastassem para neutralizar o fogo amigo da ala política, que, pouco afeita à matemática, insiste em empurrar o governo para um caminho perigosamente semelhante ao da era Dilma.
Falando em contas, o governo terá que bloquear mais de R$ 18 bilhões no orçamento de 2025 para garantir o cumprimento das regras fiscais; afinal, já de largada no ano temos um déficit de R$ 75 bilhões. A questão é: haverá vontade política para isso? Qualquer movimento nessa direção provavelmente virá atrelado a uma troca de favores na iminente reforma ministerial — porque, goste ou não, Lula não tem alternativa.
· 01:48 — O clima pesou
Nos EUA, o Walmart (WALM34) não é apenas um gigante do varejo — é um termômetro do bolso do consumidor, motor de dois terços do PIB americano. Por isso, quando a empresa divulga seus resultados, o mercado recalibra suas expectativas. Ontem, no entanto, a reação foi longe de ser entusiasmada, refletindo um cenário mais sombrio, especialmente em meio à rotação setorial em curso, com gestores desfazendo posições nas Mag7 e buscando refúgio em setores tradicionais que ficaram para trás.
Embora o Walmart tenha apresentado um trimestre sólido, o que realmente azedou o humor foi seu guidance para o ano: a empresa projetou um crescimento de vendas entre 3% e 4%, repetindo a estimativa do ano passado e abaixo dos 4% esperados pelos analistas. Essa projeção mais tímida não só derrubou as ações do próprio Walmart, mas contaminou todo o setor de varejo, expondo o que muitos preferiam ignorar — o consumidor americano está mais pressionado do que os otimistas gostariam de admitir, ainda mais diante do risco inflacionário trazido pelas tarifas.
O impacto se espalhou pelo mercado, reforçando a percepção de que qualquer sinal de fraqueza no consumo ameaça a perspectiva econômica como um todo. É por isso que os dados de sentimento do consumidor da Universidade de Michigan, previstos para hoje, ganharam ainda mais relevância. Se vierem fracos, será mais um prego no caixão do otimismo. Se surpreenderem para cima, talvez seja hora de se perguntar se essa confiança está enraizada em fundamentos sólidos ou apenas em uma esperança cada vez mais difícil de sustentar. Afinal, não é a primeira vez que o mercado prefere se agarrar a uma narrativa conveniente em vez de encarar a realidade de frente.
· 02:35 — Dividendo do Musk… Digo, do DOGE…
A ideia do chamado “dividendo DOGE” surgiu inicialmente nas redes sociais e foi posteriormente levada à Casa Branca por Elon Musk. O presidente Trump rapidamente abraçou a sugestão, descrevendo os números recentes das iniciativas de corte de custos do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE) como “incríveis”.
Mas, afinal, do que se trata essa proposta? A lógica é relativamente simples. Se o DOGE conseguir economizar US$ 2 trilhões do orçamento federal, o governo destinaria 20% desse valor para distribuir cheques de US$ 5.000 a cada uma das 79 milhões de famílias americanas que pagam imposto de renda federal. O resto das economias seria direcionado para a amortização da dívida pública, refletindo a principal prioridade do DOGE: reduzir o déficit fiscal como forma de conter a inflação e, consequentemente, diminuir as taxas de juros. Além de estimular a economia, esse esquema criaria um incentivo direto para que os próprios cidadãos denunciem desperdício, fraude e abuso nos gastos públicos, ajudando o DOGE a atingir a meta de corte de US$ 2 trilhões.
Musk já admitiu que essa meta não será fácil de alcançar. No entanto, o objetivo não precisa ser atingido da noite para o dia. Dividido ao longo de uma década, por exemplo, o plano demandaria uma economia anual de US$ 200 bilhões. E considerando que, apenas neste ano, Musk já conseguiu cortar US$ 55 bilhões, a meta parece menos distante do que muitos imaginam. Se o ritmo atual se mantiver e as iniciativas de eficiência ganharem tração, a ideia do “dividendo DOGE” pode deixar de ser uma proposta ousada nas redes sociais para se tornar uma política pública concreta — e, claro, politicamente popular. Afinal, quem recusaria um cheque de US$ 5.000 bancado pela redução do desperdício governamental? É simplesmente a narrativa perfeita.
· 03:22 — Ganhando tração
Nos últimos dias, tenho destacado como os ativos chineses ganharam força em 2025, impulsionados por uma combinação de fatores que sinalizam uma melhora nas condições econômicas. Os estímulos implementados pelo governo chinês no ano passado finalmente começaram a amadurecer, enquanto a ascensão da DeepSeek — que abordei em janeiro — redefiniu o cenário tecnológico do país. Além disso, a postura surpreendentemente mais pragmática de Trump nas negociações comerciais dissipou parte das preocupações que pairavam no ar. Entre as empresas que melhor ilustram esse rali, a Alibaba se destaca: só em fevereiro, a gigante do e-commerce adicionou US$ 123 bilhões ao seu valor de mercado. Isso reflete não apenas um otimismo renovado em relação às ações chinesas, mas também a percepção de que as políticas econômicas de Pequim estão finalmente ganhando tração.
Olhando adiante, há motivos concretos para acreditar que essa recuperação dos ativos chineses ainda tem fôlego. O governo chinês reafirmou seu compromisso em adotar medidas mais robustas para estimular o consumo interno e impulsionar o crescimento econômico. Essa sinalização, somada ao ambiente externo menos hostil e ao amadurecimento das reformas internas, sugere que o rali chinês pode estar longe de atingir seu pico. Em um contexto global ainda marcado por incertezas, a China parece determinada a retomar seu papel como motor de crescimento — e o mercado está começando a precificar essa retomada com mais convicção.
· 04:16 — Para cima ou para baixo?
Já destaquei anteriormente que a missão de Scott Bessent à frente do Tesouro dos EUA está longe de ser trivial. Ele precisa equilibrar um pacote de políticas que impulsione o crescimento econômico sem reavivar a inflação — um desafio particularmente complexo quando duas das bandeiras centrais de Trump, a redução da imigração e a imposição de tarifas, tendem a pressionar os preços para cima.
Parte dessa equação envolve um objetivo sofisticado: reduzir os juros dos títulos de 10 anos do Tesouro. No entanto, alcançar esse feito sem recorrer a medidas extremas, como contração fiscal, intervenção direta do Federal Reserve ou desaceleração econômica, é uma tarefa hercúlea. E aqui entra um componente crucial da estratégia de Bessent: a política energética americana. Durante a campanha de reeleição de Trump, o slogan “perfure, baby, perfure” foi retomado, ainda que de forma mais sutil, como um antídoto inflacionário. Isso não é mero discurso político — o preço do petróleo tem um impacto significativo nas expectativas de inflação de longo prazo. Curiosamente, essa relação tem se mostrado uma anomalia persistente: em teoria, se o petróleo está caro hoje, aumenta a probabilidade de preços mais baixos no futuro, o que, por lógica, deveria levar a uma redução das expectativas inflacionárias.
No entanto, o mercado de títulos não tem reagido dessa forma, refletindo um descompasso entre a lógica econômica e o comportamento dos investidores. Diante disso, a proposta de Bessent para aumentar a produção de petróleo nos EUA em três milhões de barris por dia nos próximos anos se torna uma peça central desse quebra-cabeça. Mais do que uma simples política energética, trata-se de uma ferramenta macroeconômica para controlar as expectativas inflacionárias, aliviar a pressão sobre os rendimentos dos títulos e, por consequência, criar espaço para uma política fiscal mais expansiva sem comprometer a estabilidade monetária. Assim, a aposta em uma maior produção de petróleo não é apenas uma estratégia setorial, mas um pilar essencial para viabilizar a agenda econômica de Trump sem reacender os fantasmas da inflação. Resta saber se o mercado comprará essa tese ou se exigirá mais do que barris extras para ancorar suas expectativas.
· 05:01 — Uma maneira alternativa e inteligente para se expor à corrida do ouro
A Empiricus discute o investimento em ouro há anos, e eu venho recomendando formalmente a presença do metal precioso desde o lançamento do M5M+ em outubro de 2023. Naquela época, a onça era negociada em torno de US$ 1.800, refletindo um cenário já favorável à busca por ativos de proteção.
Desde então, o metal acumula uma valorização superior a 60% em dólares, atingindo um novo patamar que sinaliza não apenas um repique pontual, mas sim uma mudança estrutural no…
O post Entrevista de Haddad sobre o Orçamento de 2025 e balanço do Walmart (WALM34) no 4T24 são destaques do dia; confira apareceu primeiro em Empiricus.