O projeto Drex sem blockchain representa uma virada importante na estratégia do Banco Central para o futuro da moeda digital brasileira e da tokenização de ativos reais. Durante um evento organizado pela Associação Brasileira de Bancos, Fabio Araujo, coordenador do projeto, confirmou que a próxima etapa não será construída sobre redes blockchain. Essa decisão surge como resposta direta a desafios regulatórios e às exigências de privacidade impostas pelo ambiente jurídico nacional.
Por que o Drex sem blockchain?
Optar por um Drex sem blockchain não significa que o Banco Central abrirá mão da inovação tecnológica. Araujo explicou que o modelo de blockchain funciona como uma “caixa de vidro”: eficiente, mas excessivamente transparente para lidar com informações financeiras sensíveis. Nesse sentido, a instituição busca adotar soluções que ofereçam a mesma agilidade da tecnologia distribuída, mas com maior controle sobre a proteção dos dados.
Impactos da LGPD e do sigilo bancário
Dois fatores fundamentais pesaram na escolha do Banco Central. O primeiro é a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que já estabelece padrões rigorosos para o uso de dados pessoais no Brasil. O segundo é a Lei de Sigilo Bancário, que reforça a confidencialidade das operações financeiras. Diferente de outras jurisdições, o Brasil não precisou discutir novos níveis de privacidade, já que a legislação atual garante um patamar considerado elevado. Por isso, a decisão de buscar alternativas além da blockchain reflete mais uma adequação regulatória do que um retrocesso tecnológico.
Novos objetivos do projeto
O foco inicial do Drex sem blockchain será a reconciliação de gravames, isto é, mecanismos que permitem verificar garantias em empréstimos. Esse processo envolve ativos como imóveis, veículos e aplicações financeiras, que podem ser usados para facilitar a concessão de crédito. A intenção do Banco Central é criar um sistema funcional que simplifique operações para os usuários, assegure a validade das garantias e fortaleça a confiança no mercado.
Integração de sistemas financeiros
Atualmente, transformar ativos registrados em corretoras em garantias de crédito é um processo complexo e burocrático. A meta do Drex sem blockchain é integrar diferentes plataformas de instituições financeiras, permitindo comunicação em tempo real. Essa integração deve reduzir custos, agilizar transações e ampliar o acesso ao crédito no país. Além disso, cria um ambiente mais transparente para o setor bancário, sem abrir mão da privacidade necessária.
Reações do mercado
Mesmo com a mudança de rota, o setor privado continua atento. Marcos Viriato, CEO da Parfin, empresa responsável pela solução de privacidade Rayls, afirmou que a tokenização seguirá transformando a indústria financeira. Para ele, a pausa estratégica do Banco Central não freará o avanço das iniciativas privadas, já que a economia tokenizada é vista como uma tendência inevitável.
Críticas ao modelo fechado
Apesar do otimismo de alguns setores, especialistas apontam riscos. O Drex sem blockchain pode criar um descompasso entre o Brasil e o mercado global de criptoativos. Enquanto o ecossistema internacional avança com liquidez e interoperabilidade em redes abertas, a abordagem brasileira mantém um modelo fechado, permissionado e fortemente vinculado às instituições bancárias. Essa escolha pode dificultar a inserção do país em um ambiente digital mais amplo e competitivo.
Perspectivas para o futuro
O Banco Central promete divulgar em outubro o relatório da fase 2 do Piloto Drex, documento que deve detalhar resultados, limitações e próximos passos do projeto. O grande desafio será encontrar equilíbrio entre inovação, privacidade e integração internacional. De um lado, o Drex sem blockchain pode trazer avanços regulatórios e maior confiança para o sistema financeiro doméstico. Por outro, pode restringir a competitividade do Brasil diante de países que adotam soluções abertas baseadas em blockchain.
Possíveis caminhos de evolução
Uma possibilidade futura é que o Banco Central adote soluções híbridas. Isso significaria manter parte da infraestrutura fora da blockchain, mas permitir interoperabilidade com sistemas internacionais. Dessa forma, o Brasil poderia preservar seu compromisso com a privacidade e, ao mesmo tempo, não perder espaço na corrida pela economia digital global.
Conclusão
O Drex sem blockchain simboliza uma reorientação estratégica do Banco Central. Ao priorizar privacidade, sigilo e adequação regulatória, a instituição busca construir um modelo próprio de tokenização de ativos. Entretanto, essa escolha levanta dúvidas sobre o nível de competitividade do país no cenário internacional. O futuro do Drex dependerá da capacidade de equilibrar proteção de dados com inovação e de integrar o Brasil de forma efetiva à economia digital.