A Hegemonia do Dólar e a Proposta do BRICS
O projeto do BRICS de criar um sistema de pagamento e uma moeda digital alternativa para o comércio global não representa uma ameaça à hegemonia do dólar. Essa afirmação é feita por Jim O’Neill, ex-economista do Goldman Sachs, que cunhou o termo “BRICS” em 2001. Segundo O’Neill, a rivalidade e a falta de cooperação entre a China e a Índia, as duas principais potências do bloco, tornam pouco provável a viabilidade de um projeto comum com ambições globais.
O Cenário Atual do BRICS
A ideia de que o BRICS possa se tornar um clube econômico global genuíno é, evidentemente, fantasiosa, assim como o G7. O’Neill expressa sua preocupação em relação à forma como o BRICS se vê como uma alternativa global, destacando que essa perspectiva é inviável. Ao longo dos 15 anos desde sua fundação, o BRICS alcançou poucos êxitos. Portanto, a possibilidade de uma moeda comum desafiar a supremacia do dólar parece improvável.
Além disso, a desigualdade econômica entre os países do bloco dificulta que uma moeda comum mantenha o equilíbrio cambial e monetário. De fato, a moeda do BRICS seria extremamente dependente da China, enquanto o Brasil e a Rússia teriam um papel irrelevante nesse contexto. Essa situação gera dúvidas sobre a capacidade do bloco em se unir em torno de uma moeda comum, já que as disparidades econômicas e políticas dificultam a criação de uma base sólida para tal.
Desafios e Oportunidades
O economista observa que todas as tentativas anteriores de criar uma alternativa ao dólar no sistema financeiro mundial falharam. A recente cúpula do BRICS na Rússia evidenciou as pretensões da China e da Rússia de reformular os princípios de governança global, desafiando a liderança dos EUA sobre os países ocidentais.
No entanto, O’Neill vê o encontro como um mero jogo de cena. Ele argumenta que é um encontro anual simbólico em que países emergentes, especialmente a Rússia e a China, se reúnem para demonstrar que fazem parte de algo que não envolve os EUA. Esse tipo de simbolismo, embora tenha um valor político, não se traduz em ações concretas que possam mudar a dinâmica econômica global.
Mauro Vieira, representante do Brasil na cúpula, manifestou desconforto com as suposições de que o BRICS é um bloco anti-ocidental. Este é apenas um exemplo das dificuldades enfrentadas na coordenação de países que são territorialmente e culturalmente distantes. A falta de um objetivo comum claro entre os membros do BRICS pode enfraquecer ainda mais sua posição no cenário internacional.
História e Evolução do BRICS
Antes de se tornar um bloco econômico, o BRICS era apenas uma sigla criada por O’Neill para designar países com potencial de crescimento. O termo BRIC, que não incluía a África do Sul, surgiu a partir de uma pesquisa sobre países em desenvolvimento. A formalização do bloco ocorreu a partir de reuniões informais entre China, Índia e Rússia, com a posterior inclusão do Brasil e da África do Sul.
Atualmente, o BRICS conta com Egito, Etiópia, Irã e Emirados Árabes Unidos como membros. Embora a Arábia Saudita tenha sido convidada, ela ainda mantém uma participação informal. A inclusão de novos membros, enquanto pode ampliar a influência do bloco, também traz complexidades adicionais devido à diversidade de interesses e prioridades.
O Poder do BRICS na Economia Global
O poder do BRICS é evidente, considerando que seus países membros representam 45% da população mundial e 35% da economia global. No entanto, O’Neill destaca que a economia do bloco é totalmente dependente da China e, em menor medida, da Índia. A rivalidade histórica entre esses dois países dificulta a criação de acordos comerciais bilaterais. A interdependência econômica é uma faca de dois gumes, que pode ser uma vantagem em alguns contextos, mas uma vulnerabilidade em outros.
“Levarei o BRICS a sério quando houver sinais de que os dois países que realmente importam – China e Índia – estão tentando chegar a um acordo”, afirma O’Neill. Durante a cúpula, Putin e o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, se reuniram pela primeira vez em cinco anos, comprometendo-se a promover a cooperação econômica. Contudo, muitos analistas duvidam da eficácia desses compromissos sem ações concretas.
Expectativas Futuras
O’Neill questiona a seriedade dos países do bloco ao não fecharem acordos para reduzir tarifas comerciais em negociações entre si. A expansão do BRICS torna qualquer projeto comum ainda mais complexo, especialmente com mais de 30 países manifestando interesse em participar do grupo. A necessidade de encontrar um equilíbrio entre os interesses de todos os membros é essencial, mas bastante desafiadora.
Apesar da descrença de O’Neill em uma moeda comum, os países do BRICS têm acumulado ouro ao longo de 2024. A ideia de criar uma moeda lastreada em ouro e commodities é um dos modelos estudados pelos ministros da Fazenda do BRICS. Enquanto isso, eles pretendem promover o uso de suas moedas nacionais em transações internacionais, buscando reduzir os riscos associados ao dólar e a vulnerabilidade a sanções internacionais.
Conclusão
Em suma, a proposta do BRICS de criar uma moeda digital alternativa e um sistema de pagamento não representa uma ameaça à hegemonia do dólar. As dificuldades inerentes à coordenação entre países economicamente desiguais, a rivalidade entre a China e a Índia e a falta de iniciativas concretas tornam a viabilidade de uma moeda comum bastante limitada. A história e a evolução do BRICS demonstram que, apesar de sua ambição, os desafios são significativos e requerem uma colaboração que ainda não foi alcançada. Portanto, a hegemonia do dólar permanece firme, pelo menos por enquanto. O futuro do BRICS, em última análise, dependerá da capacidade de seus membros de superar diferenças e encontrar um propósito comum.
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